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terça-feira, 24 de março de 2015

Nova Escola: Finlândia será o primeiro país do mundo a abolir a divisão do conteúdo escolar em matérias

Por Renato Carvalho, para a Rescola, aprendendo a ensinar

A campainha toca, mas, em vez da aula de História, começa a aula de “Primeira Guerra Mundial”, planejada em conjunto pelos professores especialistas em História, Geografia, Línguas Estrangeiras e (por que não?) pelo professor de Física que achou que seria uma boa oportunidade para trabalhar os conceitos de Balística.



À tarde, outro sinal, mas os alunos não vão ter aula de Biologia. Hoje a aula é sobre “Ecossistema Polar Ártico”, ministrada pelos professores especializados em Biologia, Química, Geografia e o de Matemática, que percebeu que os dados sobre o derretimento das geleiras seriam úteis para o estudo de Estatística.

Em pouco tempo, cenários como esse, que já são comuns nas principais escolas da capital Helsinki, poderão ser encontrados em toda a rede de ensino do município e nas cidades do interior. O objetivo é claro: a Finlândia quer ser o primeiro país do mundo a abolir completamente a tradicional divisão do conteúdo escolar em “Matérias” e adotar em todas as suas escolas o ensino por “Tópicos” multidisciplinares (ou “Fenômenos”, conforme a terminologia adotada pelos educadores finlandeses).

Há anos, a Educação finlandesa vem sendo considerada a melhor do mundo. Com “segredos” como valorização dos professores, atenção especial aos alunos com mais dificuldades, valorização das artes e de diferentes formas de aprendizagem e uma radical redução no número de provas e testes, o país tem consistentemente dividido as mais altas posições nos rankings do Pisa (Programme for International Student Assessment, ou Programa para Avaliação Internacional de Estudantes) com Cingapura, mas com as vantagens de oferecer uma Educação universalmente gratuita e livre dos tremendos níveis de estresse aos quais os estudantes asiáticos são submetidos.

Apesar dos excelentes resultados (ou talvez por causa deles), a Finlândia pretende continuar repensando e aprimorando seu sistema educacional. “Não é apenas Helsinki, mas toda a Finlândia que irá abraçar a mudança”, afirma Marjo Kyllonen, gerente educacional de Helsinki. “Nós realmente precisamos repensar a Educação e reprojetar nosso sistema, para que ele prepare nossas crianças para o futuro com as competências que são necessárias para o hoje e o amanhã. Nós ainda temos escolas ensinando à moda antiga, que foi proveitosa no início dos anos 1900 – mas as necessidades não são mais as mesmas e nós precisamos de algo adequado ao Século 21.”

Naturalmente, a ideia de substituir “Matérias” por “Fenômenos” como forma de dividir o conteúdo escolar e apresentá-lo aos alunos sofreu resistência inicial, principalmente dos professores e diretores que passaram suas vidas se especializando e se preparando para ensinar matérias. Mas com suporte do governo – inclusive incentivos financeiros através de bonificações para os professores que aderissem ao método – os professores foram gradualmente se envolvendo e hoje aproximadamente 70% dos professores das escolas de ensino médio da capital já estão treinados e adotando essa nova abordagem.

Atualmente, as escolas finlandesas já são obrigadas a oferecer ao menos um período de ensino multidisciplinar baseado em Fenômenos por ano. Na capital Helsinki, a reforma está sendo conduzida de forma mais acelerada, com as escolas sendo encorajadas a oferecer dois períodos. A previsão de Marjo Kyllonen é de que em 2020 a transição estará completa em todas as escolas do país.


terça-feira, 26 de agosto de 2014

Educação: o paradoxo do tempo perdido

Em palestra para gestores educacionais, criador do movimento Uncollege conta por que abandonou a escola para viver outras experiências e ensinar pessoas do mundo todo a fazer o mesmo

Por Cinthia Rodrigues, para a Carta na Escola

Um jovem de 22 anos vestido com camiseta e meias vermelhas sob um blazer social foi a principal estrela do Fórum de Lideranças Desafios da Educação, realizado pela Blackboard e pelo Grupo A Educação em (6/8/2014), em São Paulo. A diferença de idade entre o palestrante e a veterana audiência só contrastava menos do que o propósito entre os dois: Dale Stephens estava no Instituto Insper para contar a 200 gestores de instituições privadas de ensino superior como deixou a escola e, mais tarde, a faculdade para viver de incentivar pessoas do mundo inteiro a fazer o mesmo.


Há 10 anos o norte-americano do Arkansas abandonou a 6ª série depois de um recesso de meio de ano para nunca mais voltar à escola básica. A reação dos pais, lembra, foi a esperada, se revoltaram, se frustraram, choraram. Por fim, foram convencidos: “Eu não tomei esta decisão por preguiça, mas para não perder mais tempo. Queria aprender coisas que fossem interessantes, não conteúdos que alguém disse que seriam úteis, e que 99% das pessoas esquecem em seguida”, contou.

Com uma foto de cada experiência, Stephens listou o que fez da vida nos seis anos seguintes. Aprendeu a tocar instrumentos musicais, trabalhar com ferramentas, montou projetos para encontrar soluções para situações do cotidiano e grupos de estudo de temas diversos na biblioteca. “Até trabalhei em uma instituição que, ironicamente, ajudava pessoas a entrar no ensino superior”, afirmou em sua performance, arrancando gargalhadas do público.

Neste último emprego, o adolescente foi questionado pelo chefe sobre por que não fazia faculdade. Em mais slides, com elaborados gráficos estatísticos, Stephens apresentou suas ponderações. Entre elas, estava o fato de a graduação custar cerca de 29 mil dólares nos EUA e que, em 2012, 53% dos norte-americanos formados em cursos superiores não haviam encontrado colocação no mercado. “Ninguém discorda de que é preciso educar a população, mas acho que países como os Estados Unidos precisam pensar quanto da população precisa ter determinada Educação e a que custo.”

A plateia sentiu que marcou um ponto no tópico seguinte. “Cervejas e garotas”, estava escrito no próximo quadro. “Ok, se o conteúdo não é significativo para a maioria dos jovens e o diploma não garante emprego, que pelo menos o percurso seja divertido, certo?”, perguntou, recebendo apoio em forma de acenos e risos. Segundo Stephens, este foi um dos principais pontos que o incentivou a entrar em uma universidade. Acabou se submetendo a um processo seletivo e entrou no Hendrix College, mas achou improdutivo. “No final das contas, eu gostava mais de champanhe e garotos.”

Aos 19 anos, Dale, já reconhecido como um inovador em Educação nos EUA, fundou o Uncollege, organização que incentiva pessoas a estudar por conta e até mesmo dá aulas de como fazê-lo. Em 2012, lançou o livro Hack Your Education com sua experiência que foi motivo de reportagem em revistas e televisões de todo país. O programa tem matriculados e, ironicamente, cursos presenciais pagos. No ano passado, a Forbes o reconheceu como uma das 30 pessoas mais influentes do mundo com idade abaixo dos 30 anos. Seu projeto para 2014 é formar a primeira turma no exterior. Destino escolhido: Ilhabela, São Paulo, Brasil.

Ao público que se dedica a fazer justamente o contrário, ou seja, levar mais jovens ao ensino superior, Dale afirmou que não acha que todos devem abandonar os estudos, mas também não acredita que todos precisam fazer cursos tradicionais. “A Educação precisa passar por mudanças, e não vou conseguir isso sozinho. O sistema precisa mudar, por isso quero compartilhar com vocês algumas premissas às quais chegamos e que, na verdade, são bastante conhecidas, mas pouco praticadas”, disse.

As dicas do jovem empreendedor foram que o aprendizado requer:
  • participação ativa, em que as pessoas não apenas ouçam, mas façam, toquem, sintam, vejam, viajem etc.
  • contexto pessoal – o envolvimento ocorre quando o conteúdo tem sentido e utilidade concreta na vida do estudante.
  • paradas para descanso – pesquisas mostram que uma parada de alguns minutos faz o cérebro absorver o dobro de informação na sequência.
  • mentalidade de crescimento – pessoas com projetos em que os estudos a farão ser um ser humano mais valioso aprendem mais.

Parece que Bill Gates, Steve Jobs, Mark Zuckerberg e outros famosos autodidatas que preferiram a própria metodologia à academia abriram portas para jovens que tomam as rédeas da própria educação.

Saiba mais: http://www.uncollege.org/


quinta-feira, 5 de junho de 2014

Educação e cidadania: “Escola não está conseguindo responder desafios do século XXI”

Por Lilian Milena para o Brasilianas.org, em 4/6/2014

Um a cada quatro estudantes abandona a escola antes de chegar na última série do ensino fundamental. O dado foi destaque no Relatório de Desenvolvimento produzido pelo Pnud (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento), divulgado em 2013, que posicionou o Brasil como o terceiro país com a maior taxa de evasão escolar entre 100 países.

A gerente de projetos do movimento Todos Pela Educação, Andrea Bergamaschi, convidada para o debate do Brasilianas.org, na TV Brasil, destacou que, em boa parte dos casos, o aluno vem acumulando problemas de aprendizagem ao longo de sua vida escolar. “A evasão não acontece de uma hora para outra”, esclareceu.

Clique aqui para assistir ao debate completo, mediado pelo jornalista Luis Nassif

Segundo uma avaliação aplicada a 54 mil alunos pelo Todos Pela Educação, em 2012, em todos os estados brasileiros, metade das crianças entre oito e nove anos de idade já apresentava dificuldades de leitura, escrita e matemática para sua idade/série. Bergamaschi acrescentou ainda dados oficiais do Ministério da Educação que revelam que hoje 10% dos alunos do ensino médio mal sabem matemática. Logo, para evitar a evasão escolar mais tarde, é preciso focar na melhora da Educação do ensino básico.

A atualização do programa curricular das escolas também foi apontada no debate como um componente importante para evitar a evasão escolar. Para Jair Ribeiro da Silva Neto, fundador da Associação Parceiros da Educação, uma forma de resolver o problema estaria em melhorar a dinâmica do currículo escolar no ensino médio, voltado ao tempo integral e matérias eletivas, além das obrigatórias, para que o aluno tenha condições de se aprofundar mais nas áreas que lhe interessam.

Silva Neto também defendeu uma maior integração entre a Educação formal e profissionalizante. “O modelo alemão talvez seria o mais adequado para o nosso [sistema]. Hoje, na Alemanha cerca de 35% dos formandos do ensino médio não vão para a universidade mas para o ensino técnico que pode ser feito junto com o ensino médio, ou até dois anos após o término do ensino médio, para a colocação [desse estudante] no mercado de trabalho”, sugeriu.

Também convidada para o debate, Maria Alice Setúbal, Fundadora do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec), destacou que as imensas desigualdades educacionais do país só poderão ser resolvidas quando o tema Educação for visto como prioritário na estratégia de desenvolvimento.

“A escola [no Brasil] não está conseguindo responder aos desafios do século XXI. Estamos passando por mudanças enormes tecnológicas, ao mesmo tempo, é preciso trazer para a escola debates do dia a dia, desde mobilidade urbana nas grandes cidades, violência, e meio ambiente (...). No ensino médio, por exemplo, o jovem quer discutir democracia, participação, valores da sociedade. E a escola está distante disso”, pontuou.

Progressão Continuada
Maria Alice é defensora da Progressão Continuada. “É uma unanimidade em pesquisas nacionais e internacionais que a repetência não traz mais aprendizagem ao aluno. Pelo contrário, interioriza na criança que ela não pode, não sabe, não acontece. E ela acaba sendo expulsa, entre aspas, da escola conforme o aumento da distorção idade e série, fazendo ela aumentar seu desinteresse nos estudos”.

Assim Maria Alice apontou que o problema não está no sistema de Progressão Continuada, mas na sua implementação. E isso ocorre pela falta de infraestrutura humana e física nas escolas para garantir reforço escolar aos alunos que apresentam deficiência na compreensão de matérias.

Recursos
Silva Neto, da Parceiros da Educação, afirmou que não adianta apenas reduzir a defasagem dos salários dos professores para atrair profissionais às escolas públicas. A melhora do ambiente de trabalho, segurança, acesso a equipamentos adequados para o ensino e bibliotecas também são componentes que incentivam os professores a aperfeiçoarem seus trabalhos. O piso salarial médio de um professor nas cidades do Sul do país varia entre R$ 1.700 a R$ 2.000, apenas.

Andrea Bergamaschi, da Todos Pela Educação, destacou ainda que a melhor maneira de reduzir também a defasagem de conhecimentos dos professores frente às novas tecnologias é a valorização do profissional. Ela lembrou de um estudo divulgado pela Fundação Victor Cívita, publicado em 2009, mostrando que apenas 2% dos alunos que terminaram o ensino médio tinham interesse em se tornar professores no Brasil.

“Estamos pegando alunos que não tem outra opção e acabam se tornando professores da rede pública. Alguns continuam estudando e vão dar aulas na rede privada. Mas o que temos é um aluno que teve dificuldades em sua formação se tornar professor por não ter perspectiva de carreira”, analisou.

Seria preciso, portanto, criar uma estratégia para atrair e reter os melhores talentos nas escolas, defendeu Silva Neto. “Sabemos que existe uma correlação enorme entre a qualidade do professor e a qualidade do aluno. Outro dado [que sabemos] é que quanto mais tempo o aluno passa em sala de aula, mas ele aprende”, disse.

Bergamaschi apontou que é positivo o retrato dos recursos mobilizados para a educação do país nos últimos quinze anos. “O Brasil conseguiu colocar [em andamento] vários instrumentos de financiamento, sistematizar processos de financiamento para a educação básica, com a redistribuição [de recursos] através do Fundeb [Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação]”.

Para ela, o país se encontra em um nível de maturidade importante no setor educacional, considerando que não devemos apenas olhar para o volume de recursos, mas para a aplicação deles na redução das desigualdades regionais, melhora dos currículos escolares, dos instrumentos de avaliação e qualidade da formação e carreira dos professores.

Já, segundo Maria Alice, a melhor maneira do Brasil acelerar o desenvolvimento geral do ensino, reduzindo as desigualdades, é cortando caminho através do uso das novas tecnologias, construindo uma escola que responda aos desafios do século XXI.

“Não temos outra opção. Se quisermos realmente criar um país onde a educação seja o eixo central [do desenvolvimento] temos que usar os dois movimentos, ou seja, melhorar os projetos pedagógicos ao lado do uso [das ferramentas] da tecnologia”, concluiu.


sexta-feira, 2 de maio de 2014

Olimpíada de Língua Portuguesa: professores podem se inscrever até 15 de maio

Fonte Agência Brasil

As inscrições para a Olimpíada de Língua Portuguesa foram prorrogadas até o dia 15 de maio para garantir a inscrição e a adesão a todos os professores e secretarias municipais e estaduais de Educação, como informou a coordenação da competição. Podem participar professores e estudantes de escolas públicas de turmas do 5º ano do ensino fundamental ao 3º ano do ensino médio.

Clique aqui para saber mais e fazer sua inscrição

Segundo informação do portal da olimpíada, nas duas últimas semanas o site teve um grande aumento no número de inscrições. Ao mesmo tempo, o serviço de atendimento por telefone registrou o dobro do número de ligações entre os dias 24 e 29 de abril, passando de 300 para 700 ligações por dia. A Central de Atendimentos da Olimpíada (0800-771931) trabalha com até oito pessoas recebendo ligações simultaneamente. Nesses dias, em vários horários todas as linhas ficaram ocupadas.

As demais datas da competição foram mantidas. As escolas devem enviar os textos produzidos às comissões julgadoras até o dia 15 de agosto. Ao longo do ano, haverá várias etapas de seleção de textos. A fase final da olimpíada será em Brasília, em dezembro, com a divulgação dos 20 vencedores nacionais. Os alunos e professores escolhidos receberão medalhas de ouro, notebook e impressora, e as escolas, laboratório de informática.

O programa trabalha com gêneros literários específicos, de acordo com a série. No caso do ensino fundamental, os alunos do 5º e 6º anos deverão produzir poema; os do 7º e 8º anos, memórias literárias; e os do 9º ano, crônica. No ensino médio, será a crônica para o 1º ano e o artigo de opinião para o 2º e 3º anos.

O professor é quem se inscreve na olimpíada. Para que ele participe do concurso, é preciso que a Secretaria de Educação do município ou do estado faça a adesão ao projeto no mesmo período de inscrição. O docente poderá também se cadastrar no portal para ter acesso a material didático de capacitação destinado a orientar os estudantes e participar ainda de cursos de formação online. As oficinas de leitura e de produção de textos deverão ser desenvolvidas pelos professores durante as aulas de língua portuguesa.

A competição foi lançada em 2002 pela Fundação Itaú Cultural e pelo Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec), em parceria com a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), o Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed) e o Canal Futura. A iniciativa ganhou a adesão, em 2007, do Ministério da Educação. Na última edição, em 2012, foram recebidas 90.391 inscrições de professores, de 40.433 escolas brasileiras. O programa teve a participação de cerca de 3 milhões de estudantes.


segunda-feira, 14 de abril de 2014

Kubitschek, o provocador: "a escola pública é tão mal considerada quanto Valesca e o funk"

Por Cynara Menezes*

Kubitschek (Foto Ana Rayssa/Correio Braziliense)

Depois de passar a terça-feira inteirinha dando entrevistas (até perdeu a conta de quantas deu), Antonio Kubitschek decidiu desligar o telefone. Era aniversário da mulher e ele, que nem Facebook tem, decidiu desconectar para se dedicar à família. O professor de filosofia do Centro de Ensino Médio 3, em Taguatinga, cidade-satélite de Brasília, vive dias de celebridade desde que uma prova sua causou furor nas redes sociais: nela, a funkeira Valesca Popozuda aparece como “pensadora contemporânea”.

Choveram, é claro, ataques ao professor e ao colégio da rede distrital onde ensina. Um blogueiro da direita raivosa chegou a decretar o fim da escola pública: “morreu, foi para o ralo. Virou lixo”, espumou. Mas aí veio a explicação de Kubitschek. O professor fizera a questão justamente para provocar o quiproquó que causou. Sua intenção era mostrar de que tipo de carniça se alimentam os urubus da mídia. E eles caíram feito patinhos.

A própria Valesca, bem mais inteligente do que a blogueirada reaça, percebeu de cara a intenção de Kubitschek. “E se o professor colocou a questão dentro do contexto da matéria? E se o professor quis ser irônico com o sucesso das músicas de hoje em dia?”, publicou a cantora em seu Face, atribuindo o escândalo a preconceito com o gênero musical. E ainda tirou onda: “Diva, Diva sambista, Lacradora, essas coisas, eu já estou pronta, mas PENSADORA CONTEMPORÂNEA ainda não (mas prometo que vou trabalhar isso)”, escreveu. “Vou ali ler um Machado de Assis e ir treinando pra quem sabe um dia conseguir ser uma pensadora de elite!” Beijinho no ombro.

Reprodução do Face de Valesca
Professor da rede pública no Distrito Federal há 19 anos, Kubitschek, 43, é, ao contrário do retrato pintado pelos apressados, um professor bastante conceituado na cidade, admirado por colegas e ex-alunos.

Sua intenção era cumprir uma das principais tarefas do educador: estimular o debate entre os jovens. E conseguiu.

O blog fez um pequeno pingue-pongue com o professor, que não tem parentesco algum com o presidente Juscelino. O Kubitschek, na verdade, é segundo nome. Uma homenagem do pai dele ao criador de Brasília.



sexta-feira, 14 de março de 2014

Juventude e violência: um discurso a ser reconstruído

Preconceitos e estereótipos predominam quando o debate é a violência contra jovens

Afastar a influência da emoção é o caminho mais razoável para discutir o tema

Artigo de Leonardo Sá* para a revista Carta na Escola

A questão da violência contra jovens é uma das mais delicadas e dolorosas fraturas da vida social no Brasil, e é sobre ela que precisamos aprender novas formas de problematização para suscitar debates à altura dos desafios. É preciso lembrar que práticas de violência não ocorrem no vazio social, mas estão conectadas a um contexto sociológico mais amplo. As diversas formas da violência estão ligadas a variados conflitos sociais e ao campo das desigualdades que as tornam mais agudas.

Se os indivíduos adultos da sociedade contemporânea sentem-se frágeis, vulneráveis e, por vezes, descartáveis nas dinâmicas da vida competitiva e da nova economia, o que dizer dos segmentos jovens, que ainda buscam construir seus repertórios e recursos para lidar com os problemas da vivência coletiva?

Quando falamos de jovens, devemos considerar a sua pluralidade – pois não há uma juventude, mas juventudes no plural. Por exemplo, as práticas de consumo dos jovens se dão em razão da adoção de estilos de vida que possam alimentar de sentido a existência e o viver. Dizer que os jovens buscam uma vida que possa ser considerada significativa é uma afirmação que merece duas observações complementares. Primeiro, o sentido da busca é impresso pela perspectiva dos próprios jovens.

Não adianta adotar posturas adultocêntricas que pretendem impor autoritariamente para os jovens o modelo de conduta a ser adotado. Segundo, não há um único modelo nem há um formato supostamente superior que sirva como modelo para todos os outros. As juventudes são plurais em suas buscas e, por conseguinte, os modelos de referência também o são. Os jovens se realizam pela aquisição de capacidades agentivas de sujeitos (percepção, imaginação, desejo, competência, habilidade) por meio de diversos estilos de vida. E o que isso tudo tem a ver com o entendimento da violência contra jovens?

O primeiro ponto é esse alargamento que é preciso fazer nos debates. Não há relação de causa e efeito linear entre pobreza e violência. As violências estão mais próximas do fenômeno da desigualdade do que da pobreza. Afinal, pode haver diminuição da pobreza, num sentido estritamente econômico, e aumento das desigualdades pela distribuição das oportunidades de poder, cultura, arte e lazer. A renda, por si só, não é capaz de definir mudanças de estilo de vida, o que não quer dizer que alterações nas rendas das famílias não pressionem mudanças na estratificação da vida social.

Segundo ponto, as violências cometidas contra os jovens são lidas socialmente por uma tendência de criminalização da juventude. Os jovens são percebidos por certos discursos que alimentam tais percepções como “infratores”, “criminosos”, e essas criminalizações muitas vezes não correspondem à realidade dos fatos.

Terceiro, a sujeição de jovens às formas de violência (doméstica, sexual, letal etc.) precisa ser discutida a partir da relação entre vitimização e protagonismo de violência. Poderíamos aventar a seguinte hipótese para animar o debate: não há protagonista de violência que não tenha sido vítima de violência, afinal, esta é aprendida no contexto das interações sociais violentas, o que não quer dizer que toda vítima de violência necessariamente se tornará um agressor.

Quarto ponto, a própria palavra violência é polissêmica. Ela guarda tantos sentidos quanto múltiplas são as experiências de quem a usa. Em vez de definir previamente o que seja a violência, tanto nas pesquisas quanto nos processos pedagógicos, parece ser mais instigante estimular as expressões simbólicas da violência nas perspectivas de diversos atores sociais, de modo que os interlocutores, os educandos, possam perceber entre si a diversidade de contextos socioculturais que os afetam. Desse modo, esses se tornariam intérpretes do fenômeno por meio do diálogo interpares com a mediação dos educadores.

Existe uma tendência generalizada em se enxergar a violência como sendo algo realizado pelos outros. São diversas as resistências por parte de um sujeito em se assumir como agressor, perpetrador, protagonista e ator de violência. Descarregar a culpa da violência nos outros, principalmente, quando esses outros são tão socialmente vulneráveis, é uma ação de violência simbólica que alimenta o circuito das violências.

Um quinto ponto poderia ser resumido pela ideia do uso da violência como recurso de estilização de atitudes. Essa estética (produto não exclusivo dos jovens, mas de indústrias culturais, campo da publicidade e outras mediações) tem feito uma celebração de um ideal de “eu” que, no fundo, é a celebração do ideal de adulto a ser socialmente premiado: aquele que obtém sucesso, dinheiro e poder para a ostentação de seus feitos, mesmo que de modo ilegal. Há fantasias de onipotência nessas fórmulas massivamente difundidas que podem instigar as fantasias dos impotentes e dos frustrados, o que ocorre com frequência, trazendo consequências para outras formas de legitimação da participação na vida social.

Nas discussões sobre o tema da violência contra os jovens, o risco maior é o lugar que ocupam as emoções na caracterização do problema. Preconceitos, estereótipos, clichês, julgamentos morais, raivas, verdadeiras descargas emocionais ocorrem quando o tema da violência é proposto.

O próprio educador, como mediador das discussões, precisa exercer uma autorreflexão no processo para não imprimir aos debates as marcas pessoais de suas frustrações e prejulgamentos. Não há nada mais fácil do que escorregar para o campo apaixonado das lutas de opinião, o que faz do objeto da violência um dos mais difíceis de ser apreendidos de modo crítico e racional. Desconstruir os discursos sobre a violência, problematizando-os, parece ser o caminho mais razoável para enfrentar esse tema repleto de animosidades.

* Leonardo Sá é professor da Universidade Federal do Ceará e pesquisador do Laboratório de Estudos da Violência - LEV/INCT/Pronex


sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

Cidadania: "Os empregados têm carro e andam de avião. Eu estudei tanto pra quê?"

Se você, a exemplo dos professores que fizeram galhofa sobre homem "mal-vestido" no aeroporto, já se fez esta pergunta, parabéns: você não aprendeu nada

Por Matheus Pichonelli, na Carta Capital, em 7/2/2014

Professora universitária faz galhofa diante do rapaz que foi ao aeroporto sem roupa de gala.
 É o símbolo do país que vê a Educação como fator de distinção, e não de transformação

O condômino é, antes de tudo, um especialista no tempo. Quando se encontra com seus pares, desanda a falar do calor, da seca, da chuva, do ano que passou voando e da semana que parece não ter fim. À primeira vista, é um sujeito civilizado e cordato em sua batalha contra os segundos insuportáveis de uma viagem sem assunto no elevador. Mas tente levantar qualquer questão que não seja a temperatura e você entende o que moveu todas as guerras de todas as sociedades em todos os períodos históricos. Experimente. Reúna dois ou mais condôminos diante de uma mesma questão e faça o teste. Pode ser sobre um vazamento. Uma goteira. Uma reforma inesperada. Uma festa. E sua reunião de condomínio será a prova de que a humanidade não deu certo.

Dia desses, um amigo voltou desolado de uma reunião do gênero e resolveu desabafar no Facebook: “Ontem, na assembleia de condomínio, tinha gente 'revoltada' porque a lavadeira comprou um carro. ‘Ganha muito’ e ‘pra quê eu fiz faculdade’ foram alguns dos comentários. Um dos condôminos queria proibir que ela estacionasse o carro dentro do prédio, mesmo informado que a funcionária paga aluguel da vaga a um dos proprietários”.

Mais à frente, ele contava como a moça havia se transformado na peça central de um esforço fiscal. Seu carro-ostentação era a prova de que havia margem para cortar curtos pela folha de pagamento, a começar por seu emprego. A ideia era baratear a taxa de condomínio em 20 reais por apartamento.

Sem que se perceba, reuniões como esta dizem mais sobre nossa tragédia humana do que se imagina. A do Brasil é enraizada, incolor e ofuscada por um senso comum segundo o qual tudo o que acontece de ruim no mundo está em Brasília, em seus políticos, em seus acordos e seus arranjos. Sentados neste discurso, de que a fonte do mal é sempre a figura distante, quase desmaterializada, reproduzimos uma indigência humana e moral da qual fazemos parte e nem nos damos conta.

Dias atrás, outro amigo, nascido na Colômbia, me contava um fato que lhe chamava a atenção ao chegar ao Brasil. Aqui, dizia ele, as pessoas fazem festa pelo fato de entrarem em uma faculdade. O que seria o começo da caminhada, em condições normais de pressão e temperatura, é tratado muitas vezes como fim da linha pela cultura local da distinção. O ritual de passagem, da festa dos bixos aos carros presenteados como prêmios aos filhos campeões, há uma mensagem quase cifrada: “você conseguiu: venceu a corrida principal, o funil social chamado vestibular, e não tem mais nada a provar para ninguém. Pode morrer em paz”.

Não importa se, muitas e tantas vezes, o curso é ruim. Se o professor é picareta. Se não há critério pedagógico. Se não é preciso ler duas linhas de texto para passar na prova. Ou se a prova é mera formalidade.

O sujeito tem motivos para comemorar quando entra em uma faculdade no Brasil porque, com um diploma debaixo do braço, passará automaticamente a pertencer a uma casta superior. Uma casta com privilégios inclusive se for preso. Por isso comemora, mesmo que saia do curso com a mesma bagagem que entrou e com a mesma condição que nasceu, a de indigente intelectual, insensível socialmente, sem uma visão minimamente crítica ou sofisticada sobre a sua realidade e seus conflitos. É por isso que existe tanto babeta com ensino superior e especialização. Tanto médico que não sabe operar. Tanto advogado que não sabe escrever. Tanto psicólogo que não conhece Freud. Tanto jornalista que não lê jornal.

Função social? Vocação? Autoconhecimento? Extensão? Responsabilidade sobre o meio? Conta outra. Com raras e honrosas exceções, o ensino superior no Brasil cumpre uma função social invisível: garantir um selo de distinção.

Por isso comemora-se também à saída da faculdade. Já vi, por exemplo, coordenador de curso gritar, em dia de formatura, como líder de torcida em dia de jogo: “vocês, formandos, são privilegiados. Venceram na vida. Fazem parte de uma parcela minoritária e privilegiada da população”; em tempo: a formatura de um curso de odontologia, e ninguém ali sequer levantou a possibilidade de que a batalha só seria ganha quando deixássemos de ser um país em que ter dente é, por si, um privilégio.

Por trás desse discurso está uma lógica perversa de dominação. Uma lógica que permite colocar os trabalhadores braçais em seu devido lugar. Por aqui, não nos satisfazemos em contratar serviços que não queremos fazer, como lavar, passar, enxugar o chão, lavar a privada, pintar as unhas ou dar banho em nossos filhos: aproveitamos até as últimas conseqüências o gosto de dizer “estou te pagando e enquanto estou pagando eu mando e você obedece”. Para que chamar a atenção do garçom com discrição se eu posso fazer um escarcéu se pedi batata-fria e ele me entregou mandioca frita? Ao lembrá-lo de que é ele quem serve, me lembro, e lembro a todos, que estudei e trabalhei para sentar em uma mesa de restaurante e, portanto, MEREÇO ser servido. Não é só uma prestação de serviço: é um teatro sobre posições de domínio. Pobre o país cujo diploma serve, na maioria dos casos, para corroborar estas posições.

Por isso o discurso ouvido por meu amigo em seu condomínio é ainda uma praga: a praga da ignorância instruída. Por isso as pessoas se incomodam quando a lavadora, ou o porteiro, ou o garçom, “invade” espaços antes cativos. Como uma vaga na garagem de prédio. Ou a universidade. Ou os aeroportos.

Neste caldo cultural, nada pode ser mais sintomático da nossa falência do que o episódio da professor que postou fotos de um “popular” no saguão do aeroporto e se questionaram no Facebook: “Viramos uma rodoviária? Cadê o glamour?”. (Sim, porque voar, no Brasil, também é, ou era, mais do que se deslocar ao ar de um local a outro: é lembrar os que rastejam por rodovias quem pode e quem não pode pagar para andar de avião).

Esses exemplos mostram que, por aqui, pobre pode até ocupar espaços cativos (não sem nossos protestos), mas nosso diploma e nosso senso de distinção nos autorizam a galhofa: “lembre-se, você não é um de nós”. Triste que este discurso tenha sido absorvido por quem deveria ter como missão a detonação, pela base e pela Educação, dos resquícios de uma tragédia histórica construída com o caldo da ignorância, do privilégio e da exclusão.


quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Tecnologia: ‘A escola precisa preparar os alunos para programar’, diz especialista em TI

Por Tatiana Klix

O pesquisador e engenheiro de software Silvio Meira é um dos principais pensadores brasileiros sobre a tecnologia da informação e seu impacto na sociedade. Ele escreve artigos científicos e para a imprensa, dá consultorias e profere palestras concorridíssimas em universidades e fora delas.

Paraibano de 58 anos, ele também nunca saiu da escola – Silvio é formado em Engenharia Eletrônica pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica, tem mestrado em Ciência da Computação pela Universidade Federal de Pernambuco, doutorado em Computação pela University of Kent at Canterbury, da Inglaterra, e é professor titular de Engenharia de Software da UFPE.

Mas tem convicção de que a tecnologia da informação está questionando a utilidade do sistema escolar clássico.

“O que a gente vê claramente acontecendo hoje é um processo em que nós entendemos – talvez de uma vez por todas – que se aprende por toda vida, não só na escola”, diz Silvio.

Aprende-se durante uma discussão na mesa de bar que suscita uma dúvida solucionada pelo Google, aprende-se russo pelo Google Translate durante uma viagem, aprende-se assistindo a vídeos pelo Youtube, exemplifica o pesquisador. “A tecnologia existe fora da escola, em larga escala, profundamente na sociedade”, disse em entrevista ao Porvir. “O mundo não está esperando pela escola, quem está atrasada é a escola”, acrescentou.

Durante a conversa de quase uma hora, que evoluiu sobre questões relacionadas a processos de aprendizagem, problemas do ensino público brasileiro, ferramentas como Youtube e Bing, inovações na área educacional como o EdX (plataforma de cursos online de Harvard e MIT), games, robôs e programação, Silvio foi categórico em afirmar que  o “sistema educacional está falido de maneira catastrófica”.


Mas o engenheiro, que ainda é cientista chefe do centro privado de inovação C.E.S.A.R, acredita que mais difícil do que atualizar os professores ou as próprias instituições tecnologicamente é fazer com que a escola seja um ambiente de aprendizado de processos de percepção, interação, compreensão e de intervenção no mundo.

E já está preocupado com uma demanda futura, a necessidade de disseminar a cultura da programação. Para Sílvio, numa prazo de 30 a 40 anos será necessário, para exercer qualquer profissão, ter criatividade e capacidade de socialização com softwares de robôs. E é papel da escola preparar os alunos para essa realidade.

“O desafio de usar ou tecnologia da informação não existe mais. As pessoas já usam. Elas precisarão programar também”, prevê. Silvio é autor do recém lançado livro Novos negócios inovadores de crescimento empreendedor no Brasil, no qual trata do tema explicando porque o empreendedorismo virou moda no país.

Clique aqui para ler, na íntegra, a entrevista publicada no portal Porvir.


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